Começo de algo

Detetive cão e sua assistente gatinha

Eu gosto de desenhar. Não sou um “desenhista nato”, mas gosto. Sinto-me confortável me expressando dessa forma. E, nessa busca por melhorar minha forma de desenhar, principalmente agora, no ano de 2024, estudei, fiz workshops, li sobre diversos assuntos, visitei museus e conversei com outras pessoas que me inspiram. Reparei que uma das principais coisas que separam uma arte interessante de uma arte não tão interessante, aos meus olhos, é a história que ela conta.

Não quero entrar na discussão sobre o que é arte bem feita ou não, se realmente é arte ou se é comercial, ou se foi aplicada uma técnica difícil. Papo chato. O ponto é: por que certos desenhos me atraem tanto? Por que parecem ter mais alma? Mesmo com uma técnica mais simples, eles são precisos, charmosos. E, principalmente, como os artistas chegam a esse resultado?

Foi então, em uma aula de animação, que o professor disse: “Uma das maiores forças do mundo é a capacidade de contar histórias." (Não lembro se foi exatamente assim, mas a ideia era essa.) Fiquei com isso na cabeça. Era um curso de animação quadro a quadro, à moda antiga, que ensinava diversas técnicas, principalmente formas inteligentes de fazer animação e como fazer muito com pouco. Fazer animação dá muito trabalho, muito mesmo, então é preciso planejamento, acreditar no processo e saber contar a história da forma como deve ser contada.

Parece óbvio, mas, depois dessa sinapse mental e de fazer esse curso de animação, comecei a reparar melhor nas histórias que estavam sendo contadas ao meu redor. Tentei brincar com isso até em uma oficina de animação com colagens que fiz, criando uma animação sem roteiro, sem história. Mesmo assim, quando conversei com uma professora de roteiro, ela me disse: “Por que desroteirizado? Tem algo sendo contado ali, mesmo sem querer.”

Era isso, então? Por trás de uma boa obra, há uma boa história? Era só isso que eu precisava saber para deixar meus desenhos mais interessantes? Uma história com seus certos graus de profundidade e significados. E nem sempre a história contada pela obra precisa ser profunda, mas a história por trás do processo de criação pode ser.

Não vou mentir: parece um papo chato de romantizar o excesso de trabalho e vender o peixe. Falar assim faz parecer incrível o fato de esvaziar uma piscina com uma colher, por exemplo. É incrível de certa forma, mas não é o tipo de incrível que eu busco. Por isso, essa resposta não é tão fácil assim.

Mas acho que entendi, ao menos em parte. Então, com base nisso, pensei: “Ok, vou fazer um jogo com uma história que me agrade de verdade. Vamos ver o que dá.” Assim, surgiu uma oportunidade. No final de julho, esquematizei um pré-projeto. Fiz alguns cenários, alguns personagens, um enredo e o início de um universo: nasceu Na Cabeça do Bicho. Legal. Até ali, eu estava gostando do projeto, mas nada demais. Entretanto não estava só misturando um monte de referências; estava realmente colocando mais histórias nos pequenos detalhes.

Surgiu a oportunidade de apresentar uma versão na Campus Party 2024, em Goiânia, e topei. Passei algumas madrugadas trabalhando para finalizar, pelo menos, uma primeira versão. Inicial, mas suficiente para que quem jogasse entendesse qual história havia ali e captasse a mensagem que eu queria passar.

Não vou me alongar contando todo o processo e como foi o evento, porque demoraria muito e não é o objetivo deste post. Mas gosto de resumir tudo em uma imagem.

Desenho fan art da Yasmin

No último dia do evento, recebi uma fan art do meu personagem Detetive Cão, o protagonista do meu jogo, feita por uma das pessoas que jogaram: a Yasmin. Parece um gesto simples, mas me tocou profundamente. Nesse dia, entendi o que o professor de animação quis dizer sobre a força de contar uma história. E entenda: não estou dizendo que a história do meu jogo é boa. Na verdade, é bem simples, para ser sincero. Mas, para a Yasmin, não foi. E isso é o que importa.

Estou contando tudo isso para dizer que, para contar boas histórias, não basta treinar desenho, pintura e técnicas afins. É preciso fazer várias outras coisas. Uma delas é escrever mais. É engraçado pensar nisso, escrevemos muito no dia a dia — mensagens de celular, e-mails de trabalho, listas de afazeres — e, mesmo assim, quando sentamos para escrever algo nosso, sinto que não escrevo há anos. Só escrevia na escola.

Este blog é para soltar mais isso em mim e, ao mesmo tempo, documentar um pouco dos meus processos, dos meus resultados, dos meus erros e dos meus devaneios. É o começo de algo.